Notícias

Quinta-feira, 18 de Julho de 2013

Trabalho escravo: reincidência e perspectivas

Vinte e um milhões. Este é o número estimado de trabalhadores em regime de trabalho análogo à escravidão em todo o mundo. Os dados são da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e apontam também que 60% dos trabalhadores resgatados retornam à exploração. Como quebrar esse círculo representa hoje um dos maiores desafios das instituições que combatem o trabalho escravo no Brasil.

Na opinião de Lelio Bentes Corrêa, ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), para romper esse círculo vicioso é necessário que haja simultaneamente o endurecimento das ações ao combate e repressão ao trabalho escravo. Ele acredita que a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n.º 57-A/1999 é fundamental. "Assim será possível punir de forma dura os exploradores do trabalho escravo", justifica.

A PEC 57 prevê a expropriação de propriedades nas quais for constatada a prática de trabalho escravo e sua destinação para reforma agrária ou uso social. Há mais de dez anos em tramitação no Congresso, ela volta a ser discutida nessa quarta-feira (19) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal. Embora já tenha sido aprovada anteriormente no Senado, a proposta terá de passar por nova votação devido a alterações introduzidas em 2004 na Câmara dos Deputados, quando foi incluída também a possibilidade de expropriação de propriedades urbanas.

Referência

O Brasil é referência na implantação de mecanismos de combate ao trabalho escravo, apesar de ter reconhecido oficialmente a existência de formas contemporâneas de escravidão em seu território apenas em 1995. Segundo especialistas, a eficácia dessas ações só está sendo possível pela articulação entre o governo brasileiro, a sociedade civil, o setor privado e os organismos internacionais. Ainda assim, são mais 40 mil brasileiros em situação análoga à de escravo.

A advogada Débora Neves, autora do livro "Trabalho Escravo e Aliciamento", explica que o ciclo começa e termina com o aliciamento ilegal de mão de obra. "O trabalhador resgatado não tem qualificação profissional e se vê em situação de extrema vulnerabilidade e sem alternativa de trabalho e renda", afirma. Isso contribui, segundo Débora, para que novamente seja submetido ao trabalho análogo ao de escravo.

Parcerias

O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), com apoio técnico da OIT, lançou em maio deste ano o programa Movimento Ação Integrada. A ideia é firmar parceria com entidades educacionais, empresas e associações para qualificar e contratar os trabalhadores resgatados e reinseri-los no mercado formal.

A presidenta do sindicato, Rosângela Rassy, explica que não basta resgatar, é preciso inserir os trabalhadores no mercado de trabalho, e para isso o passo inicial é a educação profissional. "É um olhar diferente e sensível dos auditores fiscais do trabalho para resgatar a cidadania de centenas de trabalhadores", defende. Rassy ainda afirma que a parceria com SESC, SENAC, SENAI e outras instituições é fundamental, a fim de possibilitar a formação profissional. Empresas privadas também poderiam contribuir oferecendo vagas para os empregados resgatados.

Lista suja e repressão

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) possui um cadastro de empresas e pessoas autuadas por exploração do trabalho escravo. Até janeiro, estavam na chamada "lista suja" do trabalho escravo 409 empregadores.

Na última semana, o TST julgou o caso de um fazendeiro do Paraná que teve seu nome incluído no cadastro. Em 2007, ele foi autuado por manter 26 trabalhadores sem registro, trabalhando na extração de pinus e corte de lenha e da utilização fraudulenta pelo empregador da figura de "gatos" que contratavam os trabalhadores. Hoje, o agropecuarista luta para excluir seu nome da lista. Incluídos no cadastro, os empregadores sofrem restrições na obtenção de crédito em instituições financeiras públicas, entre outras sanções.

Segundo Neves, para que o quadro atual do combate ao trabalho escravo avance, é necessário, além da repressão por meio dos resgates, que o Estado atue de forma preventiva, combatendo as causas do problema, direcionando o trabalho de fiscalização para o momento da arregimentação da mão de obra, regularizando a relação de emprego antes da chegada às fazendas, garantindo a manutenção do vínculo de forma lícita. "O ciclo do trabalho escravo somente será combatido de forma eficaz se o Estado conjugar o trinômio prevenção–repressão–reinserção social, com qualificação do trabalhador e alternativas de emprego e renda", argumenta.

 

Fonte: TST